sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Ordem e progresso, nesta ordem

Ao longo da História, o homem inseriu, naturalmente, nos espaços por ele ocupados, registros de sua evolução que caracterizam um ou outro estágio de progresso por ele assumido. Nesse processo de construção de sua identidade humana, ele fundamentou, dentre muitos outros, o conceito de ética - que, segundo dados históricos, acompanha-o desde o princípio de sua trajetória e aponta traços históricos, temporais, culturais e outros.

Os valores encerrados pelo vocábulo "ética", no Brasil, obedecem a leis de localização geográfica, de acúmulo cultural tão diversificado e, notadamente, da própria globalização - marca do século XXI -, que acaba por fundir os tais, oriundos daqui ou de acolá, de modo sutil, mas que, nada obstante, pode resultar em um abandono dos valores éticos e essenciais, à medida em que se perde o referencial e, destarte, o indivíduo não é mais capaz de reconhecer o que é defendido como correto ou viável pelo grupo do qual faz parte.

O desapego aos valores em questão é massificado ao senso comum de maneira cada vez mais recorrente e, como consequência, é tido como normal pelo saber popular. Tal prática é, por assim dizer, "financiada" por interesses, em princípio, individuais que se sobrepõem ao que há com real importância para a totalidade. Assim sendo, a troco de somar conquistas particulares a qualquer custo, sabotam-se princípios éticos, morais, sociais, políticos, religiosos e de toda ordem, como que ridicularizando-os.

No Brasil é cada vez maior o contingente de pessoas que, com fins à projeção pessoal, ultrajam os limites éticos dos escritos "Ordem e Progresso" grifados na bandeira nacional. Deve-se ficar entendido que quando se nega ajuda a um ser humano abandonado à própria sorte - ou falta de - tanto como ao faltar com a verdade em um discurso político - maior ou menor - o mal causado é convertido ao todo, condicionado a sofrer as consequências dos que apresentam posturas contrapostas à dignidade e decência.

Os desvios de conduta apresentados são decorrentes de deficiências constadas, essencialmente, no desenvolvimento integral do ser. O que exige, pois, uma ação social direcionada, sobretudo, para o que há de mais preponderante e determinante em sua formação: a educação. Empenhados nessa árdua tarefa deve estar a sociedade por completo, contudo, dois núcleos deverão ainda mais o ser: a família e a escola. Somente dessa forma pode-se modificar o quadrante do indivíduo frente à ética nacional.
SOUZA, Daniele.
*Dissertação que me garantiu aprovação no vestibular.

Abdução do pensamento

Ele é a extensão do informe e do abstrato ao real e concreto que há em mim. Pois no pensamento, ele tem o poder de por-me em conflito comigo mesma. Então, penso, cobro-me; arrependo-me a ponto do conotativo denotar-me dores angustiantes e conflitos enlouquecedores. Faz-me deslocar a mim de um lugar ao outro sem notar nada pelo caminho, visto que nele e em tudo que está a volta, fora de mim, nada faz sentido.

E a escuridão não me assuta; e o frio não penetra minha pele; e as pessoas não são importantes. Estou impermeável; num conflito interno com um inimigo invisível, constante, jamais exibido ou revelado a mim. Porém, que me parece íntimo.

Você não sabe de quem estou falando. Porquanto ele escolhe apenas um para fazer companhia.

Quando saio desses momentos como fossem de hipinoze, tento centrar-me e buscar respostas em vão: "Quando, onde e como permiti-me envolver; de que forma e por que aceitei me desprender?" A resposta que desejo, à mente não vem. Só o que ficou em mim, desde sua primeira aparição, ou não, foi uma breve e fria apresentação:
_ Prazer, sou seu Inconsciente.
SOUZA, Daniele.

Mistério dos olhos

Ninguém é tão forte a ponto de nunca haver chorado
Eu, não diferente dos demais, chorei, confesso
Ah, sim, eu chorei!
Sinto em mim um estranho sentimento envolvente
Conferido pelo choro recente que me veio sem que o quisesse
Um choro abafado ora pelas mãos, ora pelo travesseiro -
Este, molhado, quente de tanto testemunhar esta melancolia a mim acometida

Mais do que o choro incontrolável de meus olhos
É o choro de minha alma
"Por que chora minh'alma se sabe haver quem a console?
Será por falta de alguém que não mais tem?
Será por algo que acontece sem porquê?"
O motivo é algo que, julgo eu, não deva ser proferido
Mesmo porque, seria de difícil crédito

Mas a natureza realiza seu ritual
Dia some, noite vem
E, deitada com o travesseiro ainda molhado,
Sinto do alto vir refrigério
Meu Deus a me acalentar
Cuidando de mim como um Pai
E, agora, mais esperançosa, sem perceber,
De um sono profundo posso desfrutar ao adormecer
SOUZA, Daniele.

segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

O último romântico


Digamos que um ser contemporâneo, um tanto quanto inusitado, restara de uma raça de românticos abundante há alguns séculos passados. Como seria sua ótica sobre o amor? Quais seriam suas aflições? Que traços apresentariam as colocações de um corpo másculo com essência de sexo frágil?

Eis o esboço de um desabafo interno dum hipotético homem que já não é fabricado e cuja forma há muito desintegrou:

Uma imagem, a lembrança de sumptuosa voz exprimindo uma palavra; uma palavra esperançosa apenas e, então, entrego-me aos pensamentos furtivos que me agora são íntimos. Muito, muito vulnerável é o meu pensar. Neste instante, o pensamento é só euforia. (Lembranças me corroboram minha euforia.) Noutro, porém, a racionalidade a mim imposta por convenções sociais me é exigida e traz-me, grosseiramente, à realidade. Aliás, creio ser este um mal: pensar, procurar em tudo e todos um porquê, uma verdade com suas devidas competências; pensar, pensar demais, sentir de menos.

Romântico nato que sou, na contramão de um quadrante que tenta converter-me em um racionalista implacável, tenho de precaver-me em tudo. Ah, mas só o que desejo é não ter meus pensamentos furtados por ela - e é isto que desde já pressinto. Pois, como posso eximir-me do dever de a ela destinar meus quereres, e anseios, e desejos? Diga-me, como? Se com tal olhos, e boca, e jeito me arrebatou? Como, se não dependeu de mim decidir a ela ser aprisionado; se, antes, à força fui tomado? Mas tenho confesso que com gosto tal fardo assumi.

Se em algo diferente disto, diferente dela, tento concentrar-me, de prontidão encontro-me perdido em uma escuridão sedosa e envolvente - são seus negros cabelos que me embaraçam a mente. E se há algum castigo para os hostis desejos que me perpassam o pensamento é vê-la, senti-la, exalá-la e não tê-la por não podê-lo e, pior, por não sabê-lo.

Não sei, não sei... Definitivamente, não sei onde localiza-se a matriz dos sentimentos. E, por igual ignorância, não sei como agir sobre eles, como mudá-los, criá-los ou extingui-los. Resta-me, por conseguinte, vivê-los. Ei-los aqui comigo.

Ela, pobrezinha, controla involuntariamente o terrível que habita em mim. A esta altura, já cheguei à inferência que não sou meu proprietário. Sou dela, eu sou seu. E resta-me, por fim, entregar-me a tal legado.

Até os fins de meus dias viverei a certeza de um amar desesperado e meu, unicamente; de não conhecer o que vem a ser um ser amado.

Desconfio que, caso morra minha carne, ainda permaneçam vivos meus sentimentos - lembranças da dor e da felicidade de seu fiel hospedeiro, então já não mais atormentado, mas também não mais amando, não mais realizado.

Desde já, só o que sei é que existe o amor. E o que tenho dentro em mim é tão forte e envolvente... e eu o amo. Ah, sim, é isso! Eu amo o amor! E tal sentença apresenta-se a mim como maravilhosíssima, pois não conheço outra forma de me ser se não amando, ainda que com um amar solitário que me destine a também sozinho morrer.
SOUZA, Daniele.

Encomenda

Amor, amor mesmo é aquele que se realiza, que é posto pra fora. É quase que uma excreção necessária, pois quando excreto pode ser visto e comprovado por mim, por todos.

Não que se apenas para dentro ele for não exista, mas daí recebe outro nome: vontade, apenas; e, caso não externado, acaba por morrer e, então, o nome já é outro: lembrança, que, com o passar do tempo, ganha sobrenome: perdida.

Fazer tal sentimento real consiste em expulsá-lo de si para que ele possa ser de alguém. Fora isso, amor não o é, mas aspiração vazia, falida.
SOUZA, Daniele.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Felizes para sempre...


Eu procuro o amor perdido nas páginas,
Desgastado nas cenas, hibernado onde não sei

Eu procuro o amor de fazer derreter mãos,
De aprisionar no ser a voz, de sacolejar o coração

Eu procuro o amor que entrelaça, antes, mentes, pensamentos;
E, só então, matérias sedentas, postas em erupção

Eu procuro o amor dos contos surreais
Que à infancia não pertencem mais,
Contudo que nutrem de fantasia ao menos um coração

Eu procuro o amor que prende olhar no sorriso
Olhar que no tocar do amado corpo encontre repouso,
Encontre abrigo de tudo mais que difere de tal gozo

Eu procuro o amor que não procure lábio;
Que procure alma, encontre essência,
Parte de si no estranho mais íntimo que lhe há

Eu procuro o amor capaz de vencer a banalidade que é o desejo solitário
Mas que seja frágil ao opor-se a si mesmo,
E, para tanto, cultue, pois, o seu templo divino, adorado

Eu procuro o amor de entrega magistral
Que não ameaça evitar coisa igual
Que ri de tal sentença, visto que é tola, ilegal

Eu procuro o amor quimeresco, rudimentar, avassalador
Amor irreverente, intenso e, por que não, amado
Amor que tanto idealizo e como miragem vejo

Eu procuro o amor que se perdeu no tempo
Que o levou o vento por permitirem-no, sem me consultar

Eu procuro o amor que habita em mim
Mas é prematuro para amar

Eu procuro o amor que não se possa descrever
Que venha a surpreender, que eu não saiba viver
Nem tampouco controlar

Eu procuro o amor digno de mim
Digno de se dizer amor
Digno para que eu possa amar
SOUZA, Daniele.

Saudade

É um sorriso tímido por motivo qualquer num tempo remoto
É uma lágrima sofrida e vagarosa e que, por fim, só é marca pois seca e, então, é pele, papel ou chão
É olhar perdido vagando no caos da ignorância do tudo no qual não se encontra absolutamente nada
É um gesto banal e estúpido de quem, por um instante, sonhou acordado, viveu o passado mas lembrou estar no presente, infelizmente
É uma verdade já sem compromisso e que faz sentido só para quem a realmente sente
É a persistência no pensar em algo que se teme perder no tempo, na História, em si
É a subjetividade de um querer concreto, de um anseio sem apoio; uma lembrança, nada mais
É o que foi, era ou seria; a mais fulgaz melancolia, ou mesmo vã felicidade, a qual se guarda até de tarde que é pra rememorar de um tudo que se viveu ou pretendia
É uma história com final assim... talvez triste, quiçá feliz
SOUZA, Daniele.

Indefinido

Ele é o relativo, irreverente, instável, vulnerável, incorrigível, incontrolável, fatal. Ele mesmo é o absoluto, centrado, previsível, seguro, correto, contido, vital.

Um paradoxo nato contrapondo a todo o tempo seus próprios equívocos e contradições. Sim, nas inconstâncias consiste o amor.
SOUZA, Daniele.

Desprezível eu

É tão difícil achar-se puro quando o material que nos reveste é indecoroso e vil. É mais fácil enfrentarmos uma guerra civil que confrontarmos nossa razão com a emoção e subjugarmos nossa própria carne.
SOUZA, Daniele.

Procura-se

O amor é um foragido do qual não se acumula dados. Só sabe-se a seu respeito que possui um nome, uma forma e que tem por objetivo fazer vítimas de suas iniquidades.
SOUZA, Daniele.